Por Duda Vieira | 26 de abril de 2025

Um novo relatório do CDC (Centers for Disease Control and Prevention), divulgado em abril de 2025, traz dados importantes sobre autismo infantil: o número de crianças diagnosticadas com Transtorno do Espectro Autista (TEA) continua a crescer nos Estados Unidos. Mas, além do aumento nos números, o estudo revela algo preocupante — desigualdades gritantes ligadas à raça, gênero e condição socioeconômica.

O levantamento foi feito pela Autism and Developmental Disabilities Monitoring Network, que monitorou dados de 2022 em 16 estados norte-americanos. E o que eles descobriram? Que uma em cada 31 crianças de 8 anos foi diagnosticada com autismo — uma prevalência de 32,2 casos a cada mil crianças.

Diagnóstico mais frequente não significa aumento de casos

Segundo a psicóloga e neuropsicóloga Tatiana Serra, esses dados têm dois lados. “O aumento nos diagnósticos não significa necessariamente que mais crianças estão desenvolvendo autismo, mas sim que estamos identificando melhor — e, em alguns casos, mais cedo — os sinais do transtorno”, explica a especialista.

A detecção precoce faz toda a diferença na qualidade de vida da criança e de toda a família, principalmente porque permite iniciar o quanto antes as intervenções necessárias.

Meninas seguem sendo subdiagnosticadas

O relatório também mostra que os meninos ainda lideram as estatísticas: são 49,2 casos por mil, enquanto entre meninas o número é de 14,3. Uma diferença de 3,4 para 1.

Mas isso não quer dizer que o autismo seja mais raro entre as meninas. Na verdade, como explica Tatiana Serra, “as meninas costumam apresentar sinais mais sutis e tendem a mascarar os sintomas, o que dificulta a identificação e pode levar a diagnósticos incorretos ou tardios”.

Raça e renda impactam o diagnóstico

O estudo também revela uma reviravolta nos números: crianças asiáticas, indígenas, negras e latinas foram mais diagnosticadas com autismo do que crianças brancas. Para se ter uma ideia, a prevalência foi de 38,2 por mil entre asiáticas, 37,5 entre indígenas, 36,6 entre negras e 33,0 entre latinas — contra 27,7 entre crianças brancas.

Para Tatiana, isso tem dois lados. “Mais crianças de grupos que antes eram negligenciados estão sendo diagnosticadas, o que é um avanço”, afirma. Por outro lado, ela alerta que os números também revelam um problema antigo: “Essa realidade mostra uma forte associação com contextos socioeconômicos desfavoráveis.”

Autismo e deficiência intelectual: o peso dos determinantes sociais

Entre as crianças diagnosticadas com TEA aos 8 anos, 39,6% também tinham deficiência intelectual. Entre as negras, esse número salta para 52,8%. Para os especialistas, isso está longe de ser uma coincidência.

“Essa diferença pode estar relacionada aos determinantes sociais da saúde, como acesso limitado a cuidados durante a gestação, exposição a toxinas ambientais e desnutrição”, afirma Tatiana. Ou seja, fatores externos e sociais que impactam diretamente o desenvolvimento neurológico das crianças.

O diagnóstico precoce de autismo permite iniciar mais cedo os cuidados que podem transformar a vida da criança (Foto: Getty Images)

Diagnóstico precoce avança, mas ainda não é para todos

Também tivemos boas notícias. O relatório mostra que o diagnóstico precoce está aumentando: crianças nascidas em 2018 foram 1,7 vez mais diagnosticadas antes dos 4 anos do que aquelas nascidas em 2014. E isso é fundamental.

“Quanto antes o diagnóstico, mais cedo iniciamos as intervenções que podem transformar a vida dessa criança e de sua família”, destaca a psicóloga.

No entanto, esse avanço não está igualmente distribuído. Em lugares como Laredo, no Texas, a média de idade do diagnóstico ainda é de 69,5 meses — quase 6 anos de idade. Um atraso que pode comprometer o desenvolvimento da criança.

Mais equidade, mais capacitação

Para mudar esse cenário, Tatiana Serra aponta caminhos: “Precisamos capacitar profissionais da saúde e da educação, ampliar o acesso a testes diagnósticos e promover a sensibilização da sociedade sobre os sinais do autismo desde os primeiros anos de vida.”

Além disso, ela defende uma mudança estrutural: “O diagnóstico não pode ser um privilégio. É um direito.”

O que o relatório revelou

  • 1 em cada 31 crianças de 8 anos foi diagnosticada com autismo nos EUA em 2022
  • A prevalência entre meninos é de 49,2 por mil; entre meninas, 14,3 por mil
  • Crianças negras, latinas e indígenas têm mais casos de autismo e também maior associação com deficiência intelectual
  • Diagnósticos antes dos 4 anos cresceram 1,7x entre crianças nascidas em 2018 comparadas às de 2014
  • A média de idade para diagnóstico é de 47 meses, com extremos que vão de 36 a 69,5 meses

Mais do que números, o relatório do CDC acende um alerta: é preciso garantir que toda criança, independentemente de fatores socioeconômicos, tenha acesso ao diagnóstico e ao cuidado que merece.